ROTA ESTRADA D. MARIA I / D. MARIA PIA
Freguesia de Benedita – Concelho de
Alcobaça
Colaboração Associação Desportiva e Cultural Frei João
‘A estrada era só buracos e lama. Não era estrada a preceito’ – diz Hermínia Ferreira
Dum lado era a minha casa e do outro a Lagoa. As mulheres vinham buscar água tirada a baldes. Havia uma pedra para lavar roupa. Para o lado da serra, havia o lagar de azeite. Eu andava a tocar o boi pequeno, com uma vara na mão. Os engenhos eram onde se deitava a azeitona. A água ruça ia para um lado, o azeite p’ró outro. O bagaço ia p’rós porcos. Vivi pobre. Vinham apanhar a azeitona os do Vimeiro, Acipreste, Mestras… Fez-se a estrada nova, que agora é o IC2 e obrigaram a vender o Lagar’.
Hermínia
Ferreira, Lagoa de Frei João.
‘Tirei a parede velha e deixei do lado de fora do muro da estrada, estes quatro carvalhos, filhos dos antigos Carvalhos da Violante. Era o nome deste sítio. Deixei-os por capricho. Só havia a casa da minha bisavó. No centro das ruínas, havia um carvalho muito, muito antigo e o Adolfo Pilatos andou sempre atrás de mim, para lho vender e eu vendi. Essa casa devia ter 200 anos. Aqui, tudo era carvalhos. As pessoas tinham medo de aqui passar de noite, mesmo os que viviam na Quinta da Serra, que foi aqui cortada pela Estrada D. Maria. Tordos, gaios, coelhos, lebres, raposas, rolas e uma espingardinha feita pelo meu irmão, com ferramenta de sapateiro, ocupavam-me dias e dias’.
Manuel Violante, bisneto Violante Gertrudes, perto de onde se atravessava para a Quinta do Retiro.
‘Os sapateiros iam à Feira de Rio Maior, a pé ou com carros de bois. Foi o caso do meu avô, António Quitério. Foi lá vender os bois. Se uns dias, antes da feira, chovesse, o calçado, que se levava, não chegava… A malta que ia para as vindimas comprava. Vendia-se tudo. Os sapateiros vinham para casa todos contentes. Uma época houve em que muitas oficinas de sapateiros quebraram, iam à falência… Por que seria…?
António da Silva Quitério, talvez o último sapateiro a trabalhar..
‘Passavam
almocreves com odres de azeite nas mulas, à meia-noite. Prendiam as mulas e
pediam à minha mãe para cozer batatas com bacalhau e, depois de madrugada,
marchavam, iam vender o azeite.
Fui
a primeira mulher da freguesia a ter a carta. O meu pai tinha um carro grande e
vendia calçado nas feiras e eu andava com ele a vender. Depois tivemos uma taberna
e mercearia. Só havia movimento à noite, de dia era trabalho. Vinham buscar sal
e traziam um ovo para pagar o sal.’
Maria de Lourdes Quitério, Venda Da Rega.
‘Com dois anos de idade fui para a América. A família juntou-se toda nessa altura. Vivo lá, mas o coração esta sempre cá. Aprendi o português lá, com a minha avó, Feliciana Mendes.’
Trindade Quitério, residente nos EUA,plantou, em frente da Taberna da Ti’Maria Galinha,uma nova nogueira dedicada a todos os residentes e aos que migraram.
‘A nogueira da Ti Maria Galinha levou a rama toda cortada há anos, e a minha nogueira veio em 1956, de uma noz trazida dessa, com mais de 200 anos.. Esta minha tem mais de 66 anos… Quem ma trouxe foi o Ti Joaquim da Cruz dos Caragos, que era sobrinho da Ti Maria Galinha. As nozes são muito miudinhas, mas boas!’.
António Loureiro, “Justo” sapateiro, columbófilo, Venda das Raparigas.
‘A minha mãe é que falava dos “Coimbra”. Eles vinham da zona de Coimbra para as pedreiras. Aqui, vinham beber vinho, mas só aos domingos, é que ficavam bêbados. Era o desporto deles’.
Manuela Galinha Isabel, neta da primeira Ti Maria Gertrudes Galinha
‘Conheci bem os “Coimbra”. Faziam os lancis para os passeios de Lisboa. Quando abriu a emigração para França, abalaram da vida de miséria ,que aqui levavam. Era vê-los serra acima, pareciam carreirinhos de formigas!’.
Júlio
‘Carriço’, JULIPEDRA
Gloria Marquês escreveu e recitou de cor este seu
poema, entre outros que foram lidos.
Olá!
Eu sou uma árvore!
Mas, não sou uma árvore qualquer!
Sou uma nogueira e quero ficar famosa
E também quero ser uma nogueira amorosa
Sim, porque eu vou homenagear
Uma senhora muito distinta da corte portuguesa D.
Maria, que era rainha!
E também as pessoas mais idosas da minha terra!
Sou uma nogueira, também sou feminina
Como ela, porque ela era mulher!
E mandou abrir uma estrada para o seu povo passar!
E passa mesmo à minha beira
Aqui posso ver todos os dias pessoas a caminhar
Quero ser uma árvore forte e robusta e muito feliz!
Por isso peço aos mais novos para me regarem
E cuidarem de mim, assim vou dar muitos galhos
Muitas folhas para as pessoas se sentarem na minha
sombra
Vou saber de muitas conversas da vida das pessoas
daqui e também
Das que emigraram, se calhar da até minha!
Também quero ver os meninos a brincar mais os avós
Alguns, a beber um copito na taberna da Ti Maria
Galinha!
Quero ver o sol a nascer e as estrelas brilhar
Nas noites de luar!
Quero ser um lar para passarinhos
Para fazerem os seus ninhos
E vê-los felizes a chilrear com os seus filhotes a
brincar
Quero dar muitas nozes
Só peço uma coisa: não me baterem muito quando
me forem varejar...
Não quero ficar uma galinha depenada
E o povo a não me apreciar…
NOTA:
A Rota Estrada D. Maria I / D. Maria Pia celebra as
pessoas que viveram à beira da Estrada, que uniu Lisboa ao Porto, pensada não
só para serviço dos nobres e reis, como era costume, mas para a comodidade de
todos, como diz o Alvará de 28.03.1791
O itinerário desta Rota começa na Freguesia de Asseiceira e termina no lugar de Jardoeira, freguesia da Batalha e foca apenas os troços que existem, da estrada original, quer à direita, quer à esquerda do IC2, que ‘pisa’ a EN1, ambas feitas sobre essa Estrada Real, exceto em Asseiceira, onde essas novas estradas ‘pisam’ o traçado original e é delas que também se fala nesta Rota.
Nas freguesias do concelho de Alcobaça: Benedita, Turquel, Moleanos de Évora e Moleanos de Aljubarrota, a Estrada Real recebeu o nome de Estrada D. Maria Pia em vez de D. Maria I, como é chamada nos concelhos vizinhos. Mas não confundir esta designação de D. Maria Pia com o nome da mulher do rei D. Luís, D. Maria Pia de Saboia.
No dia 25.03.2023 foram plantadas à beira da Estrada árvores “próprias do Terreno” como recomenda o Alvará e/ou adotadas outras, em todos os pontos da Rota.
No dia 23.09.2023 foram inaugurados totens junto dessas árvores com código QR, onde se podem ler memórias relatadas pelos habitantes das localidades e fotos.
O Fórum Terra Mágica das Lendas, CRL, tem vindo a recolher com as diversas comunidades relatos de História Local, Património Cultural e Memórias do século XX, cruzando-os com documentos escritos até recuar ao início da construção da Estrada.
São ainda tidos em conta diários de viajantes nacionais e estrangeiros, que por cá andaram e escreveram as suas memórias, conforme o livro de Ricardo Charters d’Azevedo ‘A Estrada de Rio Maior a Leiria em 1791’, a inspiração desta Rota iniciada em 2023 e que vai durar enquanto existir apoio das Associações Locais e Juntas de Freguesia.
Pode aceder a todos os links dos QR desta Rota em http://aterramagicadaslendas.blogspot.com
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