Carta aberta ao Ex.mo Sr. Dr. Paulo Inácio, Presidente da Câmara Municipal de Alcobaça


 

Vossa Excelência  têm por missão respeitar a identidade deixada pelos nossos antepassados   salvaguardando as nossas memórias coletivas.

A existência de um complexo reservado à implementação de indústrias ou empresas, não é incompatível com a presença de um edificado histórico, que transporta em si a memória e o espírito do lugar.

Por isso, e pondo em prática as palavras da nossa Presidente de Junta de Freguesia, em entrevista ao jornal “Gazeta das Caldas” de 29.04.2021: «as pessoas da Benedita “são muito dinâmicas” e estão treinadas para procurar soluções, onde outros só vislumbram problemas […] as gerações anteriores olharam para as necessidades da população. Foi isso que fez a Benedita. As pessoas pararam, analisaram, e perceberam as necessidades ao nível da educação, indústria e todas as áreas. Depois, fizeram obra.», vimos, por este meio, solicitar o empenho de toda  a Vossa equipa na preservação do restante edificado da Quinta da Serra,  para que um dia mais tarde, não tenhamos de lamentar o seu desaparecimento, como fazemos hoje em relação à sua capela barroca do séc. XVIII, da igreja matriz da Benedita, séc. XIII, dos tanques onde se lavava a roupa na Fonte da Senhora, do mercado dominical, da feira dos Seis, séc. XX, etc, etc...

E nós, Terra Mágica das Lendas, lembramos os   milhares de pessoas que lá trabalharam ao longo de mais de 300 anos. Há sobre uma porta do lagar um letreiro com a data de 1730. Ao lado existe a ‘chavanca’ e um acesso com uma porta notável. Mais a norte, uma enorme eira. Para a direita, a casa dos caseiros, a queijaria, o pombal, o celeiro,  e os barracões dos animais e alfaias. Cereais, azeite, olivais e pinheiros, sustentavam a azáfama agrícola de todo o ano. Resineiros de Porto de Mós, montaneiros de Pataias carregavam   samas dos   pinheiros para os seus fornos de cal, que também os houve cá. Lá existiam ‘as rendas’, parcelas de terrenos alugadas a pobres para tirarem seu sustento. Diz-se que o primeiro dono foi a Câmara de Santarém. Essa palavra lê-se na pedra, onde se inscreveu “ANNO 1730” testemunho de longa vida.  A. Rebelo, publicou no “Pórtico”, que esta quinta era ponto de apoio aos peregrinos de Santiago de Compostela.

Em breve, a Benedita vai comemorar 500 anos de existência. Desconhecem-se aqui outros edificados tão antigos. Todos lamentam a demolição da Igreja Matriz em 1962. Está na altura da Benedita refletir como tem tratado o legado dos nossos antepassados.

A construção da ALEB,- Area de Localização Empresarial da Benedita é um investimento público. Temos o dever e o direito de deixar esse legado e suas memórias às gerações vindouras. Por isso, reforçamos que a existência de uma zona industrial na Benedita com uma reserva do património protoindustrial, deve ser tida em consideração pelos nossos autarcas, pois irá pontuar o dinamismo empresarial da Benedita, olhando o futuro com orgulho no passado. 

Reiteramos as nossas preocupações com a nota da geóloga Beneditense, Sandra Lourenço:
«Desta forma, a Benedita estará não só em sintonia com a Convenção de Faro como perpetuará os seus genes empreendedores e visionários.

A Benedita consegue mais, consegue fazer algo que a distinga. É possível recuperar e revitalizar aquele espaço tão antigo e enquadrá-lo numa área próxima do industrial. Será que faz falta à Benedita uma zona industrial como tantas outras espalhadas por esse Portugal, (muitas delas vazias), e não faz falta uma zona onde se possa ter acesso à cultura, à natureza, à história, ao comércio, serviços, e também à indústria?

Seria mais interessante ter uma zona industrial completamente descaracterizada da história da Benedita que, ainda por cima, para existir, tem que destruir características "personalizantes" da Benedita, ou será mais interessante ter um espaço versátil, que permita à população ter acesso à sua história, desenvolver a sua criatividade (porque não uma área com ateliers?), ou mesmo poder criar  eventos à beira da Serra?”

 

Fórum Terra Mágica das Lendas, CRL, Lúcia Serralheiro,  Benedita 11 de Maio de 2021

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